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Textos
OS GÊMEOS

OS GÊMEOS

Conto (Uma ficção entremeada de realidades)
de Solano Brum

Esta é uma História meio complicada e extensa; porém, quem se dedica a boa leitura, há de me perdoar.



A FILHA – PRIMEIRA PARTE
 
No quarto ano da década de setenta de mil e oitocentos, entre o Sertão Mineiro e a divisa com o Estado do Espirito Santo, na Sede da Fazenda do Conde D'Almada, este, já falecido, Senhor de muitas posses na Capital, terras, cafezais e plantações, viviam, sua única herdeira.
Esta viveu por quarenta anos sob as ordens do Conde e após sua morte, resolveu deixar-se cortejar por quem sempre a admirou e esperou por sua decisão. Ambos tinham a mesma idade e o enlace matrimonial deu-se na própria sede da Fazenda, onde um ano depois, ficou grávida e esperou pacientemente pelo nascimento do rebento. Quando o primeiro choro da criança foi ouvido pelo pai, ansioso, invadiu o quarto e tentou ver de perto o rostinho do primeiro herdeiro. E qual não foi sua decepção – era uma menina.
Ao completar vinte anos, não querendo casar-se com um dos iguais, filho de um fazendeiro, apontado que fora por seu pai e do pretendente, não concordou com o que lhe chegara aos ouvidos, por sua mãe, de imprevisto. Sempre ouvira do Pai que deveria casar-se com um dos iguais da região, com posses e honrado. Ouvia e não dava crédito ao que ouvia. Foi crescendo com aquela irreverência imposta por ele, mas, passava em branco. Certa manhã, antes do almoço, como sempre fazia, cavalgara pelas proximidades. Ao voltar, dentro da cocheira, após acariciar e falar com seu fogoso cavalo, agradecendo a bela jornada, deixou-o nas mãos do tratador, recomendando a limpeza do animal e após, uma boa refeição. Atravessou o pátio e antes de pisar no primeiro degrau da escadaria dos fundos da fazenda, lá estava sua mãe. Nunca a esperava. Ergueu os olhos e a viu como se estivesse no alto de um pedestal. Todavia, o porte esguio e sua face sempre apresentando a lividez cadavérica, denunciava uma mulher sofrida, sem opiniões, como mera figura representativa numa união que já durava vinte anos. Nunca os vira de mãos dadas, dormiam em quartos separados e a simples presença de seu marido a incomodava, com exceção das refeições, as quais era um habito antigo. Mesmo assim, sentava-se calada e calada ouvia o que ele as vezes dizia e calada pedia licenças para se retirar. Assim, não foi muito difícil perceber que algo de errado estava acontecendo, razão pela qual, estava ali, a esperá-la. Avançou degrau por degrau, passos lentos até alcançar o ápice do patamar onde sua querida mãe a aguardava, por certo, com alguma surpresa. Era o esperado... Ouvindo em pé de orelha a notícia, seu rosto tornara-se avermelhado pela raiva enquanto o grito de revolta era retido na garganta. Rodou nos calcanhares e entrou. Antes de subir a seu quarto, passou pela sala e lá estava seu pai, como sempre, robustecido da vanglória pelo que lhe diria; todavia, ela passou e sequer olhou para quem a esperava ansiosamente. Tomou banho, chamou a velha bá e resolveu deixar aquele ambiente que a importunava. Sua demora no quarto fez com que seu pai procurasse outros afazeres, sem perceber que, às escondidas, ela seguia de charrete, junto com um dos trabalhadores da Fazenda, até à Cidade mais próxima, a qual era beneficiada pela Malha Ferroviária – Vitoria à Minas. Ao chegar, já à tardinha, hospedou-se numa pensão familiar e esperou pelo amanhecer do dia seguinte, para embarcar no Trem que a levaria até a Cidade de Vitória. Sempre que era possível e em momentos oportunos, comentava sobre uma possível separação. Sairia sem muitas explicações. Ouvindo por diversas vezes os comentários da filha, o pai, sempre a advertia:
“O que pretendes não tem a minha aprovação... serás um membro desligado da família e por tal, deserdada...”
Ele já beirava os sessenta anos e sua esposa, apenas ouvia e concordava com seus ditames – do mesmo modo, os dirigia aos empregados, os quais viviam separados em opiniões – e pouco importava à ele a opinião de sua cara metade e ela, por sua vez, sem nunca intervir nos assuntos de ambos, a tudo assistia desde a infância. Até então, suportara, calada, consciente dos tempos modernos os quais sua querida mãe suportara a duros golpes; porém, havia dado um “basta” em tudo e lamentava apenas por sua bá, uma mulher negra, a qual vendo-a acomodar algumas peças de roupa em uma mala, debulhava-se em prantos a um canto da parede do quarto. Pouco lhe adiantava os pedidos dessa idosa querida; tampouco, lhe contaria os motivos de sua repentina fuga. Aos mandos e desmandos do pai, suportava-os por ouvir os conselhos dessa bondosa senhora; suportava por entender que ainda não era sua hora de sair... Mas, agora, não. Caísse tudo à sua cabeça; despencasse ribanceira abaixo todos os conselhos; e, fosse o que fosse, não ficaria naquele casarão nem mais um minuto.
Enquanto arrumava sua mala em formato de baú, ouvia os gritos do pai, sempre controlador; e, abraçada à mãe, que, além da paparicação, lhe devotava grandes amores, respondia-o lá do fundo do quarto - “não” e “não”... Não fico. Deixe-me ir! Tudo aquilo que estava acontecendo, ela considerava como o pingo d'água que faltava para transbordar o recipiente de sua insatisfação. Além do mais, nada e nenhum argumento lhe demovia o sabor de viajar; de estar longe daquele recanto; tampouco participar dos afazeres da Fazenda. Considerada, aos olhos do pai, uma fábrica de herdeiros para o futuro... – o que lhe traria vantagens em tudo, é claro, repudiava só de pensar. Isso aconteceria sim, mas um dia... Não imposto pelo que acabara de saber - casar-se com um homem que ela não conhecia, para juntar bens e valores. Queria conhecer outros rapazes; a Sociedade da Capital do Sudeste do País, banhada pelo mar, além do que, considerava “o amor...” - na sua concepção – um sentimento capaz de transpassar todas as barreiras, quando houvesse a precisão da afinidade... isto sim!” Portanto, encontraria, levasse o tempo que fosse, um jovem, ou alguém que lhe retribuísse tais valores. E foi pensando assim que ela tomou – a contra gosto do pai – o veículo de ferro, mais forte que seu cavalo, o qual a levou à outras plagas.
Não foi difícil comprar um belo casarão. O Centro da Capital lhe enchera os olhos. O ouro que trouxera, transformado em dinheiro, comprou, não só um belo casarão, como recentes amizades no decorrer do ano, entre jovens femininas e masculinos, incluindo os mais idosos que ostentavam elegantes ternos, alguns com bengalas e charutos caros entre os dedos, os quais ela detestava. Mas, em se tratando de uma Sociedade a qual escolhera, aceitava, em parte, com certa antipatia e repulsa.
Como sua mãe não podia mandar-lhe dinheiro, enviava cartas e pequenas quantidades de ouro em pó; ouro esse, extraído à beira do rio por um dos empregados, vigiado por outros mais astutos e confiáveis; todavia, tudo escasseava dia após dia o que trazia tédio aos extratores. Ele mesmo, as vezes, abandonava a extração, considerando um prazo razoável para que o beiral da exploração recuperasse a extração. A própria filha já presenciara esses períodos de descanso; ela sabia que a ausência da extração revitalizava e o lucro era garantido. Poucas tinham o privilégio de trabalhar naquele beiral por serem os únicos que ganhavam um pouco mais. Esse precioso metal, ela o recebia de sua querida mãe que, vendendo-o, mantinha-se ilustre e dona de alguns imóveis. O mensageiro chegava, recebia outra carta e zarpava de volta, levando a boa nova. Sempre fora uma filha irreverente. Desde pequena, assim que passou a conhecer seus direitos como filha, começou a mostrar as garras as quais a separava do pai dia a dia, mês a mês, ano a ano. Cresceu ouvindo severas reclamações à sua mãe sobre seu procedimento... Vez por outra, enfrentava-o com unhas e dentes, ou as vezes, reservada em palavras, contornava os repúdios. Os conselhos, jamais ouvira e passou a não mais admitir as ordens do pai. Tudo isso porque apossara-se dos bens que o Conde havia deixado à sua mãe. Era uma grande grande extensão de terra. Casara-se com a filha do Conde e sua grande decepção foi o nascimento do primeiro rebento. Uma mulher. O propósito seria um filho homem, sucessor dos bens e responsável por tudo. Mas uma menina... Logo se casaria; traria para dentro da fazenda um marido o qual passaria a mandar e desmandar... Isso que não. Quisera matá-la ao nascer. Preferiu vê-la morta. A mãe a escondia cada vez que ele aparecia e tentava olhá-la de perto. E por tanto tentar engravidá-la outra vez, a infertilidade psicológica quase a levara ao desespero. Nunca mais engravidara. O castigo abatera-se naquela família e com o tempo, não mais o aceitou no leito conjugal. Passou a dormir com a menina, pois, temia que a matasse durante a noite. E tanto foi seu desprezo à filha que, no decorrer dos tempos, ela passou a perceber seu profundo sentimento de antipatia. Pai e filha se desdenhavam mutuamente.
Não conseguiam se unir e existia entre eles um sentimento de repugnância capaz de levá-los a separação. Como um pai pode odiar tanto uma filha? Como uma filha pode ser oposta a seu pai e em suas maneiras de pensar e de viver, a ponto de também odiá-lo? Por isso, resolveu partir, antes de haver um constrangimento maior, por parte dele sobre ela, magoando por assim dizer, alguém, como sua querida mãe e a velha bá, que a tinha em alto apreço.
Sem ressentimentos – pois, se tratava de seu Pai - porém, era melhor estar longe de seus olhares e domínios. Certificava-se de que, com o tempo, herdaria tudo de uma só vez. Mas sua querida mãe deixara este mundo antes dele. Voltara a fazenda para o enterro e recebeu das mãos da governanta, tão idosa quanto a mãe, uma pequena carta.

“- Minha querida filha. Talvez, quando receberes esta, já não mais estarei entre todos. Sua velha bá lamenta sua ausência; eu, muito mais. Quero que me perdoes pelo que não pude fazer por ti enquanto viva, mas, saiba que, onde eu estiver, lá, bem juntinho de Nossa Senhora, estarei olhando por ti. Tu te lembras daquele nosso segredo? Lá no fundo do sótão? Pois bem. Lá, bem no fundo do desvão, onde as vigas se cruzam e que olhávamos admirando seus encaixes; pois bem, lá, por detrás de uma delas, escondido está de teu Pai, para você, um tesoiro. Não deixes que ele a veja subir. Leve um castiçal pois, você sabe que lá é escuro e se tu abrires a janela, como fazíamos, ele há de perceber e mandar alguém te fazer algum mal. Ele mudou muito; tece em sua cabeça, grande ódio por você, e, aqui, todos o obedecem. Tenha cuidado... E que o mesmo Deus que abriu o mar e conduziu Moisés pelo deserto, por tantos anos, te capacite a um futuro promissor e que recebas dele, todas as bênçãos dos céus!”

Para sua surpresa, as joias da família estavam todas dentro de uma caixa aveludada; joias recentes e outras do século passado, pertencentes a esposa do Conde D'Almada, o avozinho querido que ela não conhecera, mas, que era docilmente citado pelos lábios de sua mãe. Dizia-lhe ser ele um homem calmo, de olhar brilhante, verdes como o fundo de um garrafão de vinho. “- Iguais aos teus!” Ela se lembrava das palavras da mãe.
Felizmente ele não a viu subir porque ela havia deixado a governanta à porta da escada. Voltara com a pequena caixa embrulhada num chales. Não foi difícil encontrá-la, porém, somente com uma indicação alguém a encontraria. Em seu quarto, estendera à velha bá um cordão de ouro a qual recusou de imediato lhe dizendo:
“- O que farei com o presente? Não tenho filho; sempre fui sua mãe emprestada... Não. Não o quero! Aqui vou morrer e não demora muito!”
Ela a abraçou carinhosamente e lhe pediu que cuidasse de seu quarto. Pretendia voltar o mais breve possível.
Quatro dias permaneceu na Fazenda. Quatro dias sem olhar para o pai que permanecia sentado em uma cadeira a qual pertencera ao Conde D'Almada tendo as pernas estiradas, enquanto os pés pousavam sobre um pequeno banco à moda escabelo. Aquele gesto dava-lhe a imperiosa figura de alguém que sustentava os pés sobre os ombros de alguém após a vitória e recolhimento dos bens preciosos do derrotado. Havia uma vigilância permanente quando ele se dispunha a sentar-se naquela cadeira enorme, sabe-se lá por quantos tempos. Todos eram de sua inteira confiança mas ele não demonstrava confiança a nenhum que lhe rodeasse.
Ao sair, permaneceu por uns minutos à sua frente. Olhando-o, quis abraçá-lo, porém, viu seu rosto virar-se lentamente, buscando outra posição. O imperioso orgulho ainda o dominava, mesmo pesando-lhe tantos anos de vida às costas.
Cumprimentou sem olhar quem estava ao seu lado e este após descobrir-se em reverências, desejou-lhe boa viagem.
O tempo passou. Meses depois, voltava à Fazenda para enterrar o pai; tomar posse do que lhe pertencia; e, deixar tudo aos cuidados de três operários de confiança e demais seguidores. Sem sua querida bá, que antes chorara sua ausência e depois o falecimento sua mãe, despedira-se desta vida a seguir, pouco lhe serviria manter a Sede da Fazenda aberta. Por isso, mandou cobrir todos os moveis com panos brancos e partiu em seguida.
Sua permanência na Capital deixava muitos curiosos insatisfeitos. Viajava para outras capitais do Brasil, passava longos meses fora e voltava ainda mais radiante.

Certa ocasião, um dos seus admiradores, no auge de uma afamada festa, esta, em comemoração ao seu aniversário, com uma só frase a deixara perturbada. E foi tão contundente que, não só balançara suas estruturas de mulher mui cortejada, como a moral que conseguira ao longos dos anos.
“- Tão linda e tão só!” E completou: “- Em  meio a tantas amigas, existe um porquê?

Era uma noite de esplendor. Mas, a pergunta a pegara sobremaneira, de impacto. De repente, seus olhos – os quais revelavam um verde que se igualava aos do fundo de um garrafão, como os comparava sua querida mãe sobre os laços familiares - instantaneamente se misturaram à cor vermelha, qual poça de sangue - enchendo-se de lágrimas, as quais sutilmente escorreram pelo rosto angelical. Temendo outra vertente, levou o pequeno lenço à face e sem nada responder, saiu de perto do jovem inconveniente, dando como encerrada a festa. Os músicos pararam de tocar e foram os primeiros a deixarem o recinto. Todos ficaram sem saber o “porquê” do acontecido. Os convidados foram gentilmente notificados. Alguns entenderam o ato como uma pilheria... Esses, cantando e rindo não levantaram suspeitas ao saírem daquele festim, porém, já outros, levaram o acontecido, como um ato de descortesia. Os que saíram insatisfeitos, estavam realmente ali para encherem a pança, deleitarem-se dos champanhes e iguarias, bem como compartilhar com o vislumbrante sorriso festeiro da anfitriã. E por essas bocas de inconformados, a aniversariante foi apontada como a “Balzaquiana” da “socialite” que expulsara de sua mansão, - não se sabe o porquê -, todos os convivas presentes. Alguns, saíram dizendo que ela havia tido um surto emocional; e, outros, que uma prematura “menopausa”, beirando a idade avançada, a levara a cometer à tresloucada atitude. “- Um verdadeiro despropósito!” - diziam outros, mais inconformados.
Sem dar crédito aos comentários desairosos, tampouco ouvidos aos “porquês”, subiu as escadas para o segundo pavilhão, e, num ato impensado, atirou o sapato no espelho, - espelho este, que refletia a imagem de quem primeiro adentrava ao quarto – e tomada pelo ódio, que, como um torvelinho se agigantava em sua cabeça, - justo quem, há poucos instantes atrás, fascinada com o evento de mais um ano de vida, brindava, com risos, beijos e abraços entre taças de cristais o champanhe doce e borbulhante -, sorvia, agora, na penumbra do quarto, o néctar venenoso do comentário despropositado de um certo jovem que a abordara. Sobre a cama, um pranto mesclado de ódio e infelicidade, deixava seu belo corpo tomado de convulsões.
Não era o que gostaria de ouvir antes dos aplausos comemorativos à sua noite de glamour... Sobre um móvel de rodas, devidamente enfeitado, o bolo de dois andares ostentava as trinta e seis pequenas e rosadas velas acesas...
Havia se infiltrado numa Sociedade a qual a recebera afetuosamente de braços abertos, com as posses adquiridas, para, mais tarde, se envolver numa capciosa armadilha face a pergunta de um jovem inconsequente, que até então, nunca vira. Deixaria passar o tempo... “- E o tempo...” - Parou de pensar, pois, ouviu algumas pancadas na porta. Alguém, tentando se comunicar com ela, repetiu as mesmas pancadas, após alguns instantes de silêncio e desta vez, um pouco mais forte. Teria que se levantar; se recompor; ajeitar seu vestido branco e brilhoso de “Melindrosa”; engolir os soluços; enxugar as lágrimas do rosto; e, atender. Antes, porém, pisou em um caco do espelho que caíra bem próximo à sua cama. Recolheu-o e mirou-se nele para tentar encontrar em seu reflexo, a alta estima que já a imaginava em frangalhos. “... E o tempo...” Voltou a completar o pensamento: “- é o carrasco de todos! Ele chega de mansinho e nos engana.... Nos pega de surpresa e nos arrasta ao fundo do poço!” - pensava e não encontrava justificativas para o ato ridículo que acabara de cometer. Agora, um pouco mais calma, caíra em si e gostaria de voltar atrás, porém, o caso já havia acontecido e o rumor, vindo lá de baixo, entrava pelas venezianas de sua janela, deixando-a ainda mais aturdida.
Até então, orgulhara-se de ser herdeira e para tanto, não fazia questão do que gastava. Morava em uma bela mansão cercada de serventes, cozinheiros e quase toda a nababesca ordem da Sociedade. Uns dizia que ela nadava em dinheiro... Outros, - por que foram ajudado por ela -, contestavam a versão, porém, à boca miúda, não deixavam de criticar. “ - Uma mulher, sozinha, com alto conceito na Sociedade... Sei não!” Muitos acreditavam ser ela “ele”, pois, juntava-se com outras moças e o escândalo aparecia nas colunas sociais. Mas ela, torcia o nariz, zombava de todos e entre uma festa e outra, fazia questão de juntar-se com outras de sua Classe Social e rirem de tudo com as taças nas mãos. Alguns comentavam sobre seu comportamento atípico à época, como sendo o “porque” de viver só; com muito dinheiro; sempre sorrindo e bebendo os melhores champanhes. E assim, em mil novecentos e vinte, com o mesmo jovem que a advertira sobre sua idade e a fizera, desde aquela noite, pensar muito sobre seu estilo de se conduzir – invejado até pelos Colunistas – que se casara. Jovem, garboso, porém, sem grandes posses, mas, possuidor de um grande coração. Altruísta, juntara-se à mulher, já madura, a qual lhe passava confiança. O falatório explodiu nas colunas sociais. “Jovem casa-se com milionária!” e completava a infame manchete: “- A oportunidade batera-lhe à porta!”
Madame D'Almada. Nome do qual, quando solteira, atendia a quem respeitosamente lhe dirigisse a palavra, tornava-se, agora, Madame (....) D'Almada Cordeiro, sobrenome do esposo.

Entusiasmado com o que soubera sobre sua fazenda a qual era administrada por um capataz, decidiu, ele mesmo, tomar as rédeas. Concordando com o marido, não fez objeções. Afinal, aceitara-o para fugir dos comentários e não ficaria naquela Cidade nem mais um dia. Pretendia, como foi seu propósito, nunca deixar o brilho das luzes das grandes Cidades; mas, nunca na mesma donde a hostilidade, a todo instante, era vinculada a sua pessoa e de seu marido. Ninguém mais a veria por lá, nem para assinar papéis. Outorgara a um Advogado os poderes (restritos) para quaisquer fins. Virou as costas para os comentários, para os amigos e às más línguas... O casamento fora sem nenhuma pompa; poucos convidados e uma notinha simples na Coluna Social. Deixaram a mansão; voltaram à fazenda; e, após dois anos, cansada de ouvir os lamentos do marido, deixou-se engravidar. Nasceu sua primeira cria. Tal qual neta, somente ela, abrilhantava a fazenda bem sucedida pelo novo administrador. Ela se orgulhava dele. Comentava sua passagem naquela fazenda até os vinte anos e os motivos pelos quais a deixara. Não gostaria que o mesmo acontecesse à menina. Mas ele era um outro homem; não se igualava ao pai que ao morrer, exigiu o não comparecimento da filha. A menina cresceu, e, aproveitando os antigos rumores sobre sua pessoa, aos quatorze anos passou a estudar no melhor colégio particular, e, tal mãe, tal filha, também permaneceu solteira até os trinta anos, quando se casou com um jovem filho de Italianos.

Foram morar na fazenda. Deste casamento, nasceram dois filhos, gêmeos, colados pelo joelhos.

OS NETOS – SEGUNDA PARTE.

Já a Madame Cordeiro havia falecido dois anos antes e o Pai, a acompanhara a seguir.
Não houve grandes embaraços na separação dos meninos.
O espanto, foi que, com apenas seis meses de vida, ela os viu se engalfinhando. Constantemente ela os deixava dormindo um ao lado do outro. Certo dia, entrou no quarto e lá estavam eles, agarrados um ao outro, como dois lutadores. Ela os separou com travesseiros mas achou aquilo muito interessante. Cautelosa, passou a prestar mais atenção aos dois. Nada comentou com o esposo, quão severo quanto indiferente sobre filhos. Da Fazenda não mais se extraia o ouro à beira do rio. Ficara para trás a maneira de como encontrá-lo. Os produtos diversificaram-se e o seu marido, impetuoso, administrava tudo montado em um belo cavalo. Certo dia, a notícia trágica: Fora levado às pressas para o médico, porém, nada foi possível fazer. Já chegara morto. O animal, bem adestrado, pisara num buraco e o corpo do cavaleiro passando por cima do ginete, caiu sob o mesmo.
Os dois meninos cresciam e vez por outra, eram separados por sua mãe e uma ajudante, porque a união dos dois, mesmo nos entretenimentos, gerava brigas e atracamentos. Se engalfinhavam por qualquer comportamento do outro. Talvez por isso, sua mãe sentira dores durante a gestação, seguido de uns pontapés que era possível notar-se quando despida. Um, lembrava a fisionomia do bisavô paterno e o outro, os traços da avó materna. “- Teriam eles voltado em espírito para viverem unidos e foram separados pelo médico? Mas, se voltaram, unidos, quais as razões de tantas aversões um pelo outro?”
Até mesmo uma palavra... um objeto pertencente a ambos, por dissensão, os levava a uma briga ferrenha. A mãe, desesperada, levava às mãos à cabeça, desgrenhava os longos cabelos e caia em desespero ante a irreconhecível falta de amor entre os dois irmãos, que, por ironia do destino, os permitira nascerem colados. Constantemente, interferindo nas brigas, separava-os e colocava-os de castigo. Dava conselhos; queixava-se de estar se definhando por tantas desavenças... Mas, era o mesmo que falar para dois toscos pedaços de paus. Havia entre os dois uma revolta injustificável, um desapego à vida, uma constante força que os atraia a se enfrentarem até a exaustão. Sua mãe, entristecida com as desavenças, certo dia, os colocou frente a frente, sentados, falando-lhes na varanda da sede da Fazenda:
“ Vocês são irmãos... Nasceram juntos e colados pelos joelhos... Eu fiz um grande mal permitindo que o médico os separassem... Deus os trouxe ao mundo daquele jeito e nós resolvemos separá-los para o bem de vocês... Por favor, tenham consciência de que são irmãos... Unam-se fraternalmente!”
“ - Eu? - disse um deles – nunca que me hei de unir a esse aí... Nem na outra encarnação!”
“ - Eu digo o mesmo – Nem Deus, pode intervir!”
“ - Não digam essas coisas, meninos! Deus, castiga!”

As palavras a levaram ao encontro de suas recordações. Até então, nunca afora mulher de frequentar Igrejas ou prestar atenção aos mandamentos das Leis de Deus. Vivera entre o luxo e a própria licenciosidade. Mas, ao gerar dois filhos gêmeos e vendo-os crescer como dois rivais, passou a prestar mais atenção aos ensinamentos Bíblicos e permitiu, por inúmeras vezes, a visita da Imagem de N Senhora, em sua casa, como espirituoso alimento hebdomadário ou recebendo as beatas nas ladainhas, sempre as dezoito horas. Nessas reuniões, numa saleta onde havia uma oratória, ao lado da específica para as visitas, todos louvavam a Deus e recebiam após, os bolos e outras iguarias, acompanhados do café com leite. Tornara-se uma mulher muito católica e participava das reuniões dominicais na Cidade mais próxima da Fazenda, junto com os dois filhos. Mesmo ali, eles se estranhavam constantemente.
Embora com grandes dificuldades sobre os temperamentos dos filhos, ela os viu crescer e logo começaram a ingerir, além do vinho, outras misturas. Brigavam a socos e pontapés... Mas um dia, a pobre Mãe ao ver um deles empunhando um facão e o outro armando-se de uma foice, resolveu suicidar-se. O caso da agressão entre os dois, só não se concretizou porque ouviram um dos vaqueiros gritar a um deles:
- Não faça isso, patrão! Sua mãe está morta... Respeita a coitadinha!

Dias depois do funeral, resolveram dividir os bens, mas foi preciso a interferência de pessoas jurídicas, pois, os mesmos eram menores de idade. Um ano depois, de posse de suas carteiras de identidades, o mais exaltado dos dois, casou-se com uma menina, a qual já havia, anteriormente, namorado o irmão.

O outro, desgostoso com o acontecido, deixou a fazenda e rumou para a fronteira, junto com sete vaqueiros mais confiáveis, lá para as bandas da divisa do Estado do Espírito Santo com o Estado da Bahia, beirando o mar.

Após longa caminhada, parando aqui, acolá, por fim, chegaram a um Povoado, onde as vistas, alongando-se, buscavam separar o céu do imenso mar, e a vã tentativa era desfeita pela distância as quais os tornavam mais unidos. Maravilhou-se com o espetáculo pois, sua intenção, desde que saíra, era por os olhos no tão famoso e chamado por todos de Oceano. Tudo para ele era novidade. Enquanto contemplava as ondas que se multiplicavam uma após outra, avistou a figura de uma jovem, que à primeira vista, parecia estar flutuando. Depois, firmando mais a vista, concluiu ser uma jovem que ajudava alguém a puxar uma rede numa canoa, muito baixa, quase à superfície das águas. Encantado pela jovem, morena, cabelos longos e corpo delgado, tentou de todas as maneiras angariar a simpatia do pai da menina praiana. Com seu cavalo amarrado em uma cocheira, junto com seus acompanhantes, instalou-se em uma pousada simples. O estalajadeiro lhe falou sobre o genitor; depois, informou ao pai da bela morena sobre o rapaz das botas de canelas longas, acompanhado de seus empregados... Certamente, seria um rapaz rico, perdido por aquelas bandas. Logo acertou encontro em sua casa, para saborearem uma refeição à moda Baiana. Com muito cerimônia, sentara-se ao lado do pai da menina e, assim que viu o bolinho afro-baiano feito de farinha de milho, cozido em ponto de gelatina e envolvido, ainda quente, em folhas de bananeira, servida com “acaça”, - bolinho feito de milho branco batido com coco -, torceu o nariz. Porém, o peixe servido, foi a parte mais sensacional. Depois de se abastecerem, anunciou que compraria algumas terras pela região. Dois meses depois, já dentro de uma enorme casa, possuidor de dois Sítios frutíferos, casou-se com a menina. A festa deixou a todos de queixo caído. Era o mais considerado entre todos no pequeno arraial praiano. Oito meses depois, ao resolver deixar a propriedade sob os cuidados do pai da menina, e com o propósito de voltar a fazenda para vender parte do que lhe era devido, montou, ele e seus ajudante, em seus cavalos e voltaram, pela mesma estrada que lhes havia trazido até àquela região. Desde que a conhecera, sempre lhe confiou a história de sua família; de quem era filho; seu endereço; e, sobretudo, seu sobrenome e descendência: “Conde D'Almada.”

A história foi recontada por toda a noite que antecedeu a sua viagem. Escreveu num livro junto com o retrato de casamento, alguns dados importantes. Pretendia voltar logo que resolvesse os empecilhos deixados para trás. Venderia a sua parte, traria mais dinheiro e nunca mais voltaria, nem para o enterro de seu único irmão.
Ela, casada, com propriedades do marido, não fez objeções quanto à sua ausência. A certidão de casamento, as anotações sobre o esposo, a renda... Tudo a deixou tranquilizada.
Ele, voltava disposto a dividir e vender sua parte, para depois, retornar pela mesma estrada, aos braços da amada, a qual viu submergir das águas do mar.

Assim que chegou e descobriu o sentido intencional do irmão, ele e os vaqueiros, tão loucos quanto o patrão, resolveu vender sua parte o mais rápido possível. Pretendia ficar um pouco mais; porém, ante as ameaças do irmão; as manobras com os seus seguidores, disse para seus acompanhantes inseparáveis:
“- O tempo urge, meus amigos!”

Ouvia-se murmúrios de um comprador local; outras vezes, o comentário de um rico proprietário de outras fazendas, muito interessado; e, por fim, um pretendente de origem Italiana, mas, ninguém chegou e lhe ofereceu, nem a ele nem ao irmão que a tudo contestava, o devido valor da extensa propriedade.

Os passos de cada um dos irmãos eram acompanhados por seus braços direitos, pois, a boca miúda, corria boatos de que, se seus caminhos se cruzassem, a morte estaria por perto.
De tanto ouvirem aberrações, eles absorveram entre si as ofensas que chegavam pelas línguas venenosas.
A peleja aumentava e acirrava ainda mais os nervos dos dois jovens. Como cada um ficou com uma parte dividida, por boca e fio de bigode, o rio que cortava a fazenda passou a ser o “pomo da discórdia”. Travavam batalhas entre si até que começou a intervenção da polícia militar.
Para tanto, os ajudantes de cada lado se juntavam e se digladiavam em tocaias; brigas a facão nas tendinhas; e, até nas pequenas festas dos Santos e nos namoros das filhas dos colonos.
O tempo escorria depressa e querendo resolver o mais breve possível aquela situação, num dia fatídico encontraram-se numa estrada. Ambos a cavalo. Ambos com seus ajudantes. Todos brigaram. Dois mortos e a aperna de um dos irmãos decepada por uma foiçada. O outro, caído, queixava-se de não mover as pernas, tampouco os braços. O que perdera a perna, pelo sangue vertido morreu sem sequer receber assistência e o outro, pelo fato de estar tetraplégico, veio a falecer logo em seguida.
No enterro do primeiro, o padre lembrou a todos presentes sobre o Velho Testamento “- Olho por olho, dente por dente...” - Mas, que “O Senhor Jesus” pregara somente o bem... O amor entre os homens... “Amai-vos uns aos outros...” “ - que não podia haver entre os dois, bricas, justo eles que haviam nascidos do mesmo útero e colados pelos joelhos! - Qual o direito do médico em separá-los? Estariam unidos em espírito agora?”
Perguntava aos ouvintes e não recebia resposta ao rápido texto sobre o Velho e o Novo Testamente.

Parte da fazenda que fora dividida sob forte protesto entre os irmãos falecidos, foi oferecida a venda, por direito, pela esposa, viúva do irmão que morrera de paralisia.
Nada mais prosperou no lugar. Havia boatos de que era assombrado. Muitos beberrões nas tendinhas deixavam escapar “causos” sobre a aparição de dois vultos, andando, só que, tropeçavam um no outro, como se estivessem amarrados pelas pernas; outros, vangloriavam-se de haverem visto pelos caminhos, batalhas entre dois espetros... sendo que um, pulava com uma só perna sobre o corpo do outro, imóvel no chão; uma mãe chorando; a água do riacho secando ao extremo; luzes de velas acesas ao longo dos caminhos... Animais morrendo pela peste!
O vazio se estendeu ao longo das fronteiras da fazenda. Almas dos que morreram nas batalhas, vagando, sem destino... O comentário nas tendinhas servia e muito para que o dono servisse mais e mais as pingas, para depois, expulsar os indesejáveis e outros que não tinham mais dinheiro para gastarem e apenas ouviam.

OS BISNETOS

A esposa, após vender sua parte, seguiu viagem para a Capital do Espirito Santo. Nunca mais se teve notícias da mesma que saiu levando sua filha de colo e outra, ainda no ventre. O medo lhe aflorava aos olhos sobre uma possível gestação de gêmeos e as desavenças recomeçarem. Mas deu-se por vencida quanto aos pensamentos inoportunos ao ver o nascimento de outra menina, de olhos tão verdes como o fundo de um garrafão.
O novo proprietário deixou o local dois anos depois da compra, porque, além de ser advertido sobre a possibilidade de ser mal assombrada, passou a perceber coisas estranhas à noite, seguidos de lamurias e ranger de dentes. Daí, mandou demolir sua parte, dividir os cômodos e queimar os utensílios que lhe pertenciam. Depois, mandou construir em local mais afastado, uma sede, não muito longe do rio.

A outra parte do casarão que não foi demolida, passou longos anos com a fama de mal assombrada. E como ninguém conseguia comprá-la, posto que, o proprietário havia morrido e não se conhecia parentes, foi invadida por um homem alto e forte. Suas vestes impressionava a todos que por ali passavam. Impecavelmente brancas, ele distribuía as indumentárias a quem se dispunha a segui-lo e permanecer apoiando seus conselhos. Pouco falava e gesticulava sempre entre o “sim” e o “não”. A qualquer pergunta, gesticulava.

Havia um quadro do antigo proprietário. O “Conde” A ele, nada acontecera; seria a ponta das lembranças para qualquer possível herdeiro. Brasão, havia, porém, nunca fora devidamente reconhecido, mas, que seria sustentado por longos anos à frente. As terras, não. Havia documentos registrados em Cartórios mas nunca dividido como proposto pela filha mais velha. O invasor não mexera em nada. A tudo conservou usando a grande sala, a cadeira e o escabelo. Tudo foi mantido intacto e guardado com respeito, pois, o invasor havia recebido em sonhos, uma mensagem sobre dois irmãos, herdeiros, que chegariam inesperadamente e que o local seria uma espécie de Magnânimo Atendimento Espiritual (MAE).

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Uma das meninas, com doze anos de idade, faleceu, devido a um tumor no cérebro. A mais nova, porém, casou-se com dezessete anos de idade e foi morar no Município de Colatina. Fez progressos e depois voltou para Vitória. Sua neta nasceu, para sua alegria, pois, temia a gestação de sua filha.

Tantos tempos não bastou para ela e sua mãe permanecerem no anonimato. Fizeram de tudo para que o ramo da árvore genealógica da família do “Conde D'Almada” fosse decepado e queimado. Primeiro por não ter nenhuma certeza de sua nobreza (a dele), depois, a fama de uma descendente, que descobrira entre retratos e recortes de jornais, sendo um fuxico aqui e outro ali, haver sido, a “ inconveniente, a mais afamada no meio social.”
Porém, a descendente fora apontada, mesmo assim, quando formara-se em professora municipal. Para tanto, fazia questão de não esbanjar muito dinheiro e se esquivava daqueles que pretendiam importuná-la, tentando envolvê-la numa argumentação sutil, fora de propósito. Nada respondia e desviava sua atenção a outros argumentos; afinal, não conseguia entender o conceito a pesar-lhe nos ombros sobre os procedimentos de alguém que vivera antes dela, naquela Cidade.
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A linda praiana viu o pai falecer e esperando pelo esposo, passou a ser cortejada no lugarejo, por estar sozinha. O filho que ela esperava na retirada do marido, nasceu, cresceu e a levou dali para um local mais conhecido por Caravelas, por haver conhecido por aquelas bandas, sua futura esposa. Aceitou seguir com o filho porque o caso da ausência do esposo lhe causava constrangimentos. Todos se achegavam, riam, gerando uma incompatibilidade com os que lhes conheciam, apesar de ser uma Senhora de posses, rica e que sustentava a mão de ferro todas as propriedades adquiridas.
“ - Uma mulher que casa; um marido que não volta nem pra conhecer o filho; um filho que cresce sem o pai...” Vários comentários e ela ficando sem notícias e esperando e envelhecendo e esperando...

Viu o neto nascer, crescer, sempre lhe afirmando ser de linhagem nobre. Ao completar maioridade, o neto foi visitar os possíveis parentes, bisavôs, descendentes da suposta Família do Conde D'Almada. Mas, o que viu o deixara deveras apreensivo. Da parte vendida, pela esposa do Tio Bisavó, nada havia sobrado.
O medo havia importunado a todos que tentaram progredir. Até mesmo o comprador via coisas inimagináveis. Vultos e vozes entre os cômodos da parte dividida, eram constantes. Por isso mesmo, o proprietário mandou demolir e atear fogo em tudo. Assim que as brasas abrandaram, mandou jogar sal sobre as cinzas e voltou-lhe as costas, sem se permitir ouvir comentários sobre a propriedade demolida.

Pelos comentários sobre o comprador, haveria de encontrar pessoas que falassem a respeito das coisas que ouvira de sua mãe, contada a ela, por seu avó... mas, não tão absurdas quanto as que ouviu. E o que viu, na parte deixada por seu tio bisavô, a qual ficou sem ser vendida, o deixara ainda mais apreensivo. Era uma espécie de “magnânimo atendimento espiritual”, (MAE) que recebia os endemoniados e oferecia curas mediúnicas.
Queria vender essa pretensa parte, mas, os documentos retidos pelo sitiador não lhe chegavam as mãos. Mas eles existiam. Porém, a desculpa fora de que “haviam se perdidos ou queimados...” Sua avó, nunca havia chegado até ali, para reconhecer sequer um palmo das terras ou reclamar sua parte como herdeira. Como possuía Sítios e Casas comerciais, pouco lhe interessava sobre o que fazer com o que ouvira de seu marido sobre os parentes do Conde D'Almada. Ficou esperando o retorno de seu marido, gravida e sem respostas às perguntas de seu pai. Assim o viu nascer, crescer e após, seu neto. Este neto, sem muito precisar sobre vender a parte ou deixá-la sob os cuidados do invasor, saiu do local, entristecido e voltou para dar as notícias à sua querida mãe. Assim que chegou, com certas reservas pelo que havia visto, pouco falou para não constranger sua avó, porém, pelo que havia ouvido, muito se orgulhava, pois, com
certeza, pertencia a uma linhagem nobre.
Solano Brum
Enviado por Solano Brum em 07/01/2017
Alterado em 25/08/2021
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